quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Barra do Gil nunca mais!

DANUTTA RODRIGUES

Domingo de sol a pino e um convite atípico: passear de lancha na Bahia de Todos os Santos. Não era bem uma lancha, na verdade era uma saveiro daquelas bem antigas que só cabem no máximo sete pessoas, contando com o marinheiro. Tinha tudo para ser um dia perfeito, sol, churrasco, cerveja, praia, piscina, enfim, um cenário digno de um domingo especial, isso se não fosse a ressaca com que acordei nesse dia. Não sabia que o simples fato de ter me embriagado no dia anterior fosse interferir tanto na minha imagem perante as pessoas convidadas para esse passeio maldito.
Tudo começou quando às 9h da manhã, minha irmã Rafaela, me acorda aos berros e me sacudindo como se eu fosse um saco de batatas:
- Acorda, acorda, acorda...
Eu tinha chegado às 6h da manhã em casa, depois de uma “festa de arromba” que aconteceu na casa de um amigo. Na hora em que ouvi ao fundo a voz da minha irmã praticamente suplicando para que eu acordasse, consegui abrir com muito esforço o olho direito e perguntei com uma voz embolada:
- O que é?
- Rato acabou de ligar dizendo que já está passando aqui para pegar a gente pra passear de lancha – ela respondeu.
Rato é amigo de Rafa e nessa hora, tentei recordar de algum convite que ela ou ele tivessem feito a mim e não conseguia lembrar e retruquei:
- Ah, eu não vou não!
- Como assim não vai? – indignou-se minha irmã e me intimou com a seguinte frase:
- Se você não for eu nunca mais consigo convite das festas pra você.
As festas as quais Rafa estava se retratando, eram as festas publicitárias que sempre gostei muito de ir, afinal, são festas em que a bebida e a comida rola solta, sem contar com o público que é uma maravilha! Ah, esqueci de comentar que minha irmã é publicitária e sempre conseguiu pra mim as melhores festas que fui até hoje, está aí o motivo do poder que ela detinha sobre mim.
Na hora em que fui ameaçada me senti na obrigação de arrumar forças, sabe lá Deus onde, e consegui levantar e fui me arrumar para irmos para o tal passeio. Como se não bastasse a pressão, ela ainda queria que eu chamasse uma outra amiga minha para ir conosco. Parecia até que a tal lancha era da minha irmã, pois ela queria povoar o barco, isso porque um amigo de Rato estava afim dela e ela não queria nada com ele. Lá fui eu então para o telefone ligar para uma grande amiga, do tipo “topa tudo”, para nos acompanhar. Ela aceitou conforme eu já esperava e fomos as três para o tal passeio de “lancha”.
Chegamos ao nosso destino: o Iate Clube. Logo nos apressamos para partir para a Ilha de Barra do Gil, lugar onde Carlos, o amigo de Rato afim da minha irmã, tinha uma bela casa com piscina e nos esperando para usufruir. Assim que nos lançamos ao mar chamei Rafa e cochichei no ouvido dela:
- Eu não tô me sentindo bem.
- Também você não se contenta em beber pouco – disse Rafa, irritada.
Me dirigi a Déa e falei:
- To vendo tudo rodar.
Andréa, como uma boa amiga compreensiva e entendida nesses assuntos alcoólicos retrucou:
- Toma uma Skol Dan, nada como uma cerveja para arrebatar uma ressaca.
Mal eu sabia que o conselho de Andréa me renderia tanta vergonha e também tantas risadas.
Tomei uma Skol antes de chegar em Barra do Gil e esse foi o meu atestado de óbito. Assim que chegamos na ilha, fui a primeira a subir no bote para que chegasse o quanto antes em terra firme. Isso porque a vontade de vomitar estava insuportável e se eu continuasse naquela saveiro “toc toc” eu ia me atirar no mar de vez. Enfim, quando botei os pés naquela areia branca, fininha, avistei um mato verde pronto para receber mais de cinco “gofadas” de cerveja. Pois é, assim que cheguei na Ilha vomitei compulsivamente na frente de todos o que estavam comigo e todos os que estavam curtindo um dia de sol em pleno domingo em Barra do Gil. Quem conhece Barra do Gil vai ter mais ou menos uma idéia do que passei. A praia estava lotada de gente.
Minha irmã, extremamente preocupada com seus amigos, afinal era a primeira vez que íamos a um churrasco na casa do Carlos, olhou pra mim com seu típico olhar de reprovação e falou:
- Você me mata de vergonha, é a primeira vez que lhe apresento aos meninos e você já vai dando um vexame desses.
Não dei muita importância ao que ela estava falando, até porque as minhas condições só me permitiam pensar uma coisa: “nunca mais eu vou beber na vida”.
Passado o susto, ou melhor, o vexame, fomos em direção à casa de praia do Carlos. No caminho, ouvi a frase mais imbecil e imprópria no momento:
- Poxa, pensei que só tinha chamado vocês três para o churrasco – disse Rato num tom irônico.
- Como assim? – indagou Rafa.
- Não sabia que Danutta tinha trazido Raul também! – exclamou “inteligentemente” o Rato.
Para quem não sabe Raul é um apelido popular que os beberrões inveterados nomeiam o vômito. Enfim, depois dessa pérola que foi proferida, chegamos finalmente na casa de Carlos.
A casa era linda, tinha uma piscina enorme na frente dela. Ao lado tinha um quiosque com uma churrasqueira que já estava nos esperando para preparar o nosso almoço. O jardim da casa era lindo demais, com alguns coqueiros e muitas flores que enfeitavam o ambiente. Porém, o lugar que eu, Andréa e Rafaela mais admiramos foi o banheiro. É isso mesmo, assim que chegamos me deu uma vontade incontrolável de ir ao banheiro, e como toda mulher que se preze, chamei minha irmã e minha amiga para me acompanhar. Até hoje Rafa se arrepende de ter aceitado o meu convite infame.
Fomos discretamente ao banheiro e chegando lá fui direto para a privada. Rafa e Andréa aproveitaram para se maquiar, mesmo com os sons e barulhos que estavam acontecendo no momento da minha “liberação”. Tudo estava correndo bem até que vou, enfim, dar a descarga depois de mais ou menos uns 5min. Foi aí que pedimos para sumir daquele lugar. Assim que apertei o botão para eliminar qualquer vestígio da minha indisposição, ao invés de descer, a água e os elementos contidos numa forma pastosa e aguada, subiu. Aquele mar de cocô parecia que ia nos atingir naquele momento. O desespero tomou conta de nós três:
- Vai transbordar – disse Rafaela com uma cara de dar dó.
- Tampa a privada – disse Andréa, que naquele momento só fazia rir.
- E agora? – eu, a causadora do transtorno, que também só fazia dar risada.
A água não cedia, chegou inclusive a escorrer um pouco no chão e nada daquele líquido descer pro seu destino natural. Ficamos sem saber o que fazer, se fôssemos pedir ajuda para desentupir, a vergonha seria maior do que deixar como estava e simplesmente fingir que nada aconteceu. Até que Rafa, em meio as minhas risadas e ao descontrole emocional de Andréa, que também só fazia rir sem parar, teve uma idéia:
- Já sei, vou procurar um balde – disse ela como se estivesse encontrado a melhor solução para o caso.
- Pra quê? – falei num tom desentendido.
- Espera a água descer mais um pouco e aí a gente tenta jogar mais água por cima pra ver se ajuda a empurrar tudo de uma vez – respondeu ela.
Não entendi muito bem a idéia da minha irmã, pois se o que a gente queria era eliminar aquela água, ela queria jogar mais por cima? Mas enfim, Rafa sempre tem boas idéias e sempre confiei nela para esses assuntos difíceis de resolver. Lá foi ela procurar um balde pela casa sem chamar atenção de ninguém, se é que isso era possível naquele momento, pois já haviam se passado 35min dentro do banheiro.
Eu e Andréa continuamos lá, tentando dar descarga para que ao menos diminuísse a quantidade de água, só que a cada vez que a gente apertava aquele bendito dispositivo da privada, mais a água subia, e o medo de que transbordasse tudo pelo mictório era muito maior.
Ficamos esperando Rafa voltar e enquanto isso o volume de água cedeu um pouco.
Porém, nada do cocô descer também. Acho que na hora de dar descarga voltava mais cocô ainda, ao invés de finalmente ir embora. No banheiro tinha uma janela grande, que ficava na parte onde tinha o chuveiro, e que dava para o quintal da casa, local onde Rafa tentava incessantemente encontrar um balde. Já se passavam 45min, quando Rato resolveu perguntar a nós como é que eu estava e o que estava acontecendo:
- Gente, tá tudo bem? – perguntou ele preocupado conosco.
- Mais ou menos, ainda tô vomitando um pouco – menti, afinal era muito menos vergonhoso falar que estava vomitando do que contar realmente o que estava se passando.
Rafaela finalmente conseguiu encontrar um balde e resolveu passar para Andréa pela janela. Enquanto aguardávamos ela voltar para o banheiro, a água estava cedendo cada vez mais, porém só a água. Assim que Rafa estava retornando, Rato a interceptou e perguntou se eu não queria algum remédio para enjôo:
- Toma Rafa, dá um Dramin para Danutta tomar – disse ele preocupado.
- Não Rato, é bom que ela aprende – retrucou ela revoltada com a situação.
Assim que Rafa entrou no banheiro, Rato queria entrar junto para nos ajudar, afinal ele achava que eu estava vomitando. Nessa hora começamos a empurrar a porta, as três, contra Rato para que ele não entrasse e visse aquela privada do jeito que estava. Com um misto de desespero e agonia, conseguimos trancar a porta e Rafa falou a seguinte frase para justificar a expulsão:
- Amigo, Danutta ta com vergonha de você – afirmou ela com veracidade.
- Que nada Dan, acontece com todo mundo. Vou deixar vocês sozinhas então, mas não demora não tá, e qualquer coisa chama a gente – respondeu ele gentilmente e para nossa felicidade.
Já se passavam uma hora desde que entramos naquele banheiro. A água já estava pela metade, quando Rafa decidiu jogar um balde cheio de água para ver se ajudava a descer tudo. O efeito foi contrário. Antes mesmo do balde terminar, a privada ficou cheia mais uma vez e quase que transborda todo aquele cocô.
Enfim, resolvemos ficar mais um pouco até que pelo menos a água ficasse pela metade de novo. Após mais 20min, finalmente o líquido cedeu e chegou a um ponto razoável, foi quando tive uma idéia:
- Já sei! Vou jogar shampoo por cima para que as espumas pelo menos fiquem por cima do cocô, porque aí ninguém vai ver o que é que tem por baixo!
- Nada disso. A gente vai ter que dar um jeito, porque se alguém entrar nesse banheiro vai ser a maior vergonha – retrucou Rafa, não concordando com a minha idéia.
Andréa, enfim, se pronunciou e disse:
- Oxe Rafa, vamos fazer isso sim. Vai chamar mais atenção se a gente continuar nesse banheiro por mais tempo – disse ela preocupada com os mais de 90min que estávamos lá dentro.
Fui então fazer o que tinha proposto. Gastei quase metade de um shampoo da Wella que estava no Box do banheiro e consegui fazer uma massa de espuma dentro daquela privada. Resolvemos sair então.
Já passavam das 16h30min, afinal, esqueci de comentar que saímos de Salvador somente às 13h30min, quando finalmente fomos participar ativamente do churrasco.
Chegando lá no quiosque, estava rolando muita comida, muita bebida, e eu, que já me considerava pronta pra outra, fui em direção à comida e a uma latinha de cerveja. Foi aí que minha irmã enfurecida falou no meu ouvido:
- Se você encostar em qualquer uma dessas coisas, eu te mato!
- Mas eu já tô bem, e tô com fome! – disse eu com medo da reação dela.
- Tome água de coco e pronto – intimou Rafa, revoltada com o que tinha acontecido.
Às 17h, ou seja, somente meia hora depois que tínhamos saído do banheiro, fomos embora de Barra do Gil, pois o marinheiro tinha um compromisso em Salvador às 18h30min. Ao subir na saveiro, pensei que ninguém nunca iria saber verdadeiramente quem tinha feito tal serviço no banheiro, pois haviam três pessoas lá dentro: eu, minha irmã e Andréa. Até hoje não sabemos o que aconteceu com aquela privada, nem qual repercussão gerou sobre o acontecido. A única coisa que sei é que até hoje ninguém sabe quem cagou no banheiro. E, como se não bastasse, Rato ainda falou assim que chegamos em Salvador,a seguinte frase:
- Dan, vê se não traz mais “Raul” tá?!
Porém nunca mais houve outro passeio, nunca mais fomos convidadas para a casa do Carlos.

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