quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Um velhinho prá lá de educado!

Rafaela Anunciação

Terça-feira e, pra variar, o meu dia foi super corrido. O telefone que não parava de tocar, os clientes mal educados e alguns legais que precisei atender, os e-mails, os textos da Faculdade que precisava ler e o atual que, além de chato, é muito grande, enfim, fiz tudo que precisava fazer e saí correndo para conseguir chegar na Faculdade a tempo de pegar a primeira aula. Até aí era somente eu, meus problemas e pensamentos.

Peguei um ônibus e mais parecia uma sardinha dentro da lata, tipo aquelas que a gente compra em mercadinho, sabe? Pois bem! Como estava nessa situação, fui me empurrando até chegar bem na frente, quase perto do motorista, e fiquei tão próxima de um rapaz que o cara quase me oferece seu "colo amigo".

No ponto de transbordo do Iguatemi, o meu quase "íntimo" amigo me cedeu seu lugar. Detalhe: ele estava sentado no segundo banco, após o banco reservado para os velhinhos. Esse era, preferencialmente, para gestantes e deficientes físicos.

Ao meu lado, uma senhora, aparentando seus 45 anos, até educada. Usava óculos, vestia calça jeans e uma camiseta - dessas que a gente compra em liquidação nessas lojas de “povão” - que parecia da filha mais nova.

- Boa noite, eu lhe disse.

- Boa, ela me respondeu e virou o rosto para janela. Não parecia estar a fim de papo.

Ainda na Estação Iguatemi, subiu um senhor, baixinho e, como quase todos, usava uns óculos que, sinceramente, não sabia se eram dele, uma camiseta colorida quadriculada bem surrada e uma calça, sei lá, parecia brim. Calçava uma sandália de dedo e tinha uma cara de mau humor que dava medo até de olhar, parecia um mordomo de casa mal assombrada dos filmes.

- Eu acho um absurdo a gente ter que andar em um ônibus tão cheio e ainda por cima em pé - gritou ele, literalmente, no ouvido de um rapaz que estava ao seu lado.

O coitado chegou revirar os olhos e virar o rosto, acho que para rir.

- É verdade - disse o rapaz, agora com uma cara e um tom igualmente sérios.

E ele continuava, gritando, parecia um louco, em períodos de ataques, que era um absurdo e blá,blá,blá.... Eu continuava com meus pensamentos, só que não tão entretida, afinal, ele não deixava. Quando estou bem distraída, senti algo pesado sobre meus ombros.

- Você está ouvindo o que estou falando, mocinha? Me perguntou ele, acho que com todo resto de força que ainda tinha.

Levantei a cabeça que estava baixa e, com cara de paisagem, disse:

- Só não ouve quem não quer, o senhor está gritando!

- Você é muito atrevida, será que deixou a educação em casa ou não recebeu?

Olhei para ele, agora, realmente séria, como podia alguém que nem conheço me ofender desse jeito. Fiquei p. da vida. Como se não bastasse me chamar de mal educada, o simpático velhinho pegou em meu braço como me forçando a levantar. Acho que nem minha mãe faz mais aquilo comigo. Aí, o sangue ferveu. A senhora ao meu lado e quase todo o ônibus olhava com uma cara meio séria e ao mesmo tempo com um sorriso, desses que agente tenta não escancarar, sabe?

- Afinal de contas tio, qual é o seu problema? Perguntei ainda tentando ser educada.

- Quero que você saia do meu lugar - ele me disse.

Soltei um sorriso sarcástico e pensei: agora chegou minha vez!

- O senhor sabe ler? Foi alfabetizado?

Ele me olhava com cara de poucos amigos

- Quero que você levante porque esse lugar é meu – afirmava, como se fosse o dono da verdade.

Velho abusado. O cara estava se achando.

- Por acaso o senhor é deficiente ou está grávido?

Acho que foi o fim da picada para ele, pois me fulminava com o olhar. Ele ainda segurava meu braço e agora com tanta força que já estava dolorido. Me livrei com um movimento rápido e brusco.

- Você está de brincadeira comigo?

- Não. Só tenho certeza que o mal educado aqui é o senhor - olha como fui educadinha - além de estar gritando e me apertando, ainda está fora da sua razão. Esse lugar é reservado, preferencialmente, fiz questão de soletrar letra por letra, para gestantes e deficientes físicos e, a menos que o senhor se enquadre em uma das situações, esse lugar não é seu.

Nesse momento me senti. Deixei o pobre velhinho sem palavras.
O ônibus ainda estava muito cheio e, por isso, ele não teve como sair de perto de mim. Senti que ele ficou com vergonha e, devo confessar, eu também. Não gosto de agir assim, mas foi ele quem pediu!

Meu ponto se aproximou e eu levantei, porém antes fiz a boa vontade do dia, ou melhor, da noite.

- Senhor, pode sentar, eu já vou soltar.

Acho que ele sentiu vontade de me jogar pela janela, mas mesmo assim sentou. Antes de descer ainda consegui ouvir o velhinho comentar com a senhora simpática que estava ao meu lado:

- Esses jovens não respeitam mais ninguém.

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